DIFICULDADES-4: AS FRONTEIRAS DO CORAÇÃO

A difícil mediocridade
Já meditamos sobre as almas que têm metas baixas na vida, um “limiar baixo”. E víamos como essa atitude morna gera muitas “dificuldades subjetivas”, que um coração generoso e um ideal alto não teriam.
São as “dificuldades da mediocridade” que, em maior ou menor medida, todos nós temos. Cada um de nós poderia abrir um livro-registro e cadastrá-las. Para tanto, bastaria identificar tudo aquilo que achamos “demais” e que nos move ao protesto…, e reconhecer, com justa vergonha, que o problema não é que seja de mais, mas que a nossa alma é de menos.
É “demais” assumir compromissos espirituais (Missa dominical mesmo que custe sacrifício, oração e leitura diárias do Evangelho, etc.) para quem é incapaz de prescindir dos “compromissos” assumidos com a preguiça, ou com o aperitivo diário (esse, sim, compromisso fiel e perseverante), ou com a horinha intocável de exercício físico (que, em si, é muito louvável).
É “demais” dedicar um tempo – renunciando a empregá-lo em gostos pessoais – a um amigo que esteja precisando de ajuda, a um doente ou até mesmo a um filho que exija uma atenção mais abnegada… É demais para aqueles que, pensando bem, não é que façam “de menos” pelo seu próximo, é que simplesmente não fazem nada ou quase nada…
É “demais” ter de suportar os defeitos e indelicadezas dos que convivem conosco; é tão “demais”, que muitos podem lembrar-se de autênticas “tragédias” provocadas por insignificâncias: uma resposta um pouco atravessada, um cumprimento frio, os cotovelos em cima da mesa… Esquecemos que, para um cristão, os dois limiares normais do amor ao próximo são: Amarás o próximo como a ti mesmo (Mt 22, 39) e amai-vos uns aos outros como eu [Jesus] vos amei (Jo 13, 34).
Quando são Paulo descreve os traços da caridade cristã, não está escrevendo para anjos, mas para seres humanos como nós. E eis as metas que indica como limiar normal da caridade: A caridade é paciente, a caridade é benigna; não é invejosa, não é jactanciosa, não se ensoberbece, não é descortês, não é interesseira, não se irrita, não guarda rancor; não se alegra com a injustiça, mas compraz-se na verdade; tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo sofre (1 Cor 13, 4-7).
A pessoa que aceita como norma de vida este programa, dificilmente se queixará das dificuldades na família ou no ambiente profissional. O que para outros seriam dificuldades, para o cristão de limiar alto e sadio são ocasiões diárias de amar e de servir.
As fronteiras do coração
Tudo isso quer dizer, portanto, que o problema de grande parte das nossas dificuldades se reduz a um problema de ampliação das fronteiras do coração. É preciso que nos decidamos a elevar o nosso nível de normalidade, sem nos deixarmos dominar pelos níveis baixos que o ambiente pretende impor.
Neste ponto, o cristão deve ser especialmente firme e coerente. Caso contrário, facilmente se deixará arrastar pelo fluxo de um meio social onde cada vez se torna mais comum que até mesmo aquilo que é francamente “anormal” se normalize e se imponha como lei: “Hoje em dia, as coisas são assim, as coisas mudaram. O que causa estranheza – não faltará quem o diga – é que um homem, decorridos cinco ou dez anos, ainda esteja com a mesma mulher com quem se casou…”
O mundo parece mergulhar aceleradamente na idolatria do agradável, do fácil e do cômodo. Facilidades da técnica, que nasceram como meios de a pessoa se organizar e trabalhar melhor, de aproveitar melhor o tempo, de possuir maior informação, vão-se transformando em utensílios de amolecimento e vício. Tende-se a amar o fácil por ser fácil, o agradável por ser agradável, sem cuidar de discernir se é o certo e o bom.
A pessoa que se deixa dominar por esses critérios fica moralmente enfraquecida e chega a não ver sentido naquilo que dá sentido à vida, só porque o julga difícil: não vê sentido no amor-doação, na renúncia para servir, na abnegação para ser fiel, em suma, nos valores morais que forjam a grandeza do homem. Daí a necessidade, urgente necessidade, de os cristãos alargarem as fronteiras do seu coração, para assim trazerem um sopro de vida a este mundo que parece estar perdendo a alma.
O sopro renovador
Ora, esse sopro renovador só será dado ao mundo pelos que estiverem dispostos a rever os níveis dos seus ideais e a elevar o teto da sua normalidade. Isto há de chocar, sem dúvida, no ambiente4. Mas, no fim das contas, será um choque de revitalização, uma sacudidela capaz de despertar do letargo aqueles que ainda podem reerguer-se e caminhar.
Esses homens e mulheres de níveis morais sadios, acima da média doentia, talvez não sejam compreendidos. Talvez precisem da coragem de começar a lutar sozinhos, sem sentir apoio no ambiente, nem sequer no mais próximo. Terão de ser corajosos para serem autênticos e não dobrarem o joelho ante o que “todo o mundo faz”… Por isso, deverão amar muito a Verdade, e será também preciso que se decidam a apagar do seu dicionário a palavra dificuldade ou, pelo menos, a mudar-lhe o sentido.
No novo dicionário dos que aceitam os limiares de Cristo, o verbete dificuldade será, pois, explicado assim: “Dificuldade: a maior parte das vezes, é o mal-estar gerado pelos nossos defeitos ou pela nossa mediocridade; algumas vezes, é um obstáculo objetivo que se encontra na vida, e que – tendo sido enviado ou permitido por Deus – tem como finalidade firmar-nos no bem, fazer-nos crescer espiritual e humanamente, purificar-nos e elevar a nossa alegria até uma altura até então insuspeitada”.

Adaptação de um trecho do livro de F. Faus, O valor das dificuldades

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