"A EUCARISTIA COMO CORPO DE CRISTO" Evangelho de João 6


Corpus Christi nos fala do Corpo de Cristo. Antes de começarmos a espiritualizar
demais a realidade da eucaristia, convém refletir um momento sobre essa realidade: é corpo, é sangue, é matéria. João nos fala dessa realidade no discurso sobre o Pão da
Vida. É corpo, é pão. É alimento real, como é real o corpo. Diz João, no capítulo 6 de seu evangelho:
"Eu sou o pão da vida". E continua: "Eu sou o pão vivo descido do céu. Quem comer deste pão viverá para sempre. O pão que eu darei é a minha carne para a vida do mundo." E mais à frente diz ainda: "Quem come a minha carne e bebe o meu sangue
tem a vida eterna e eu o ressuscitarei no último dia. Pois minha carne é verdadeiramente comida, e meu sangue éverdadeiramente bebida. Quem come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim, e eu nele".
Quem se aproxima da eucaristia comunga realmente o corpo e o sangue de Jesus, isto é, sua vida. Comungar significa viver nele, assumir seus compromissos, sua vida, seu projeto, sua pessoa. Comunhão não é rito mágico, é acesso à vida de Deus no Cristo.
Não é bom esquecer que Jesus é o Verbo de Deus, mas é melhor ainda lembrar que esse Verbo se fez carne, se fez homem. A primeira carta de João, capítulo 4, verso 2, diz que
quem "confessa que Jesus veio na carne é de Deus". A realidade primeira que precisamos afirmar a respeito de Jesus é a sua encarnação. Ele realmente se fez homem, assumindo nossa inteira realidade. O que significa dizer que assumiu nossa
materialidade, nosso corpo e sangue. Jesus não é simplesmente espírito. Jesus é homem, com seu corpo e sangue. A realidade corporal faz parte de sua vida. É nela que ele vive.
É através dela se relaciona com os outros, com Deus. Jesus foi, e é integralmente e totalmente humano. E como o corpo faz parte da realidade humana, Jesus o assumiu. É esse corpo que os discípulos vêem, é nele que o reconhecem na cruz e na ressurreição. Jesus é integralmente humano e integralmente Deus. A união da natureza humana e da natureza divina numa única pessoa, isso o que acreditamos e afirmamos quando
professamos nossa fé em Jesus Cristo, Verbo de Deus encarnado. Ora, uma vez unidas, essas naturezas não mais se separam, já que essa união é substancial e não acidental, é
essencial e não mero detalhe.
Por isso, para nós católicos a eucaristia não apenas representa Jesus, seu corpo e sangue.
Falamos de uma real presença de Jesus no sacramento da eucaristia. Uma real e integral presença. Ressuscitado, Jesus o é também com sua humanidade, que inclui a corporeidade. Certo que se trata de uma corporeidade um tanto diferente da que
conhecemos agora, mas ainda é corporeidade. Ele ainda carrega as chagas da paixão, isto é, as marcas de sua humanidade. Essa humanidade não se separa de sua divindade, porque senão teríamos duas pessoas, e não é isso que afirmamos em nossa fé. Daí que, presente na eucaristia, Jesus está na totalidade de sua pessoa: com sua natureza divina e com sua natureza humana. Daí ele poder falar do pão como sendo sua carne. Sabemos
que os humanos têm carne, e se Deus é Espírito, não precisa tê-la. Se falamos do corpo de Cristo, é porque reconhecemos que sua humanidade, assim como sua divindade, está presente no sacramento da eucaristia.
Sabemos, também, que a Igreja é o Corpo de Cristo. São Paulo já diz que da Igreja o Cristo é a cabeça, e nós somos os membros. Formamos um único corpo. Somos na
verdade um corpo, o corpo de Cristo. Ele viveu sua vida em seu corpo histórico, nascido de Maria. Nós, Igreja, formamos o seu corpo místico, unidos a ele como o corpo se une à cabeça. A Igreja é o corpo de Cristo. Ora, se ao recebermos a eucaristia comungamos o corpo de Cristo, evidentemente também comungamos com a Igreja. Todo sacramento é deixado por Deus à sua Igreja. Não existe sacramento para ser celebrado
individualmente, mas em Igreja. A eucaristia também guarda esse relacionamento com a totalidade do Corpo místico de Cristo. Comungamos na Igreja, em Igreja, com a Igreja.
Nunca sozinhos. E em cada eucaristia, celebramos com a Igreja inteira, unidos misticamente a ela, como Corpo de Cristo. É importante a gente lembrar disso para não ficar pensando que a comunhão é simplesmente um acontecimento entre eu e Deus. A
Igreja é realidade necessária também na comunhão. Até porque a Eucaristia acontece na Igreja, une a Igreja, faz com que ela aconteça. O Concilio Vaticano II já reconhecia que a eucaristia é a fonte e o ápice da vida cristã. E a vida cristã é vivida em Igreja. Somos o Corpo de Cristo. Guardamos relações uns com os outros, com a Igreja inteira, a Igreja Universal. Dai que a eucaristia é um acontecimento eclesial. Por isso não se celebra a
eucaristia numa única intenção, com uma única pessoa, grupo ou movimento. A eucaristia é sempre celebrada em união com toda a Igreja, com a Igreja universal. Paulo escrevendo aos Corintios diz em l Cor 10, 17: "Já que há um único pão, nós, embora muitos, somos um só corpo, visto que todos participamos deste único pão". A Eucaristia nos forma como Corpo místico de Cristo, nos unindo, pois participamos da mesma mesa, tomando o mesmo alimento. Daí que a comunhão eucarística não é só um
acontecimento pessoal, mas eclesial, ligando-se à uma realidade maior, a toda a Igreja. Por outro lado, já que falamos de corpo, nós costumamos cuidar de nosso corpo, e isso deve acontecer. É justo e natural que cuidemos de nosso corpo. Pois bem, se somos
Corpo de Cristo, Igreja, devemos também cuidar desse corpo. A eucaristia nos une em Igreja, para que cuidemos dessa união. A unidade da Igreja diz respeito a todos nós, e a preocupação com ela deriva da própria realidade eucarística. Cuidar do corpo eclesial e de sua unidade é obrigação derivada da participação na eucaristia. Não comungamos apenas por nós e para nós, mas para toda a Igreja. E o cuidado com o corpo eclesial se
dá, fundamentalmente, pela participação na comunidade. Cuidamos da Igreja a partir de dentro, como quem dela faz parte. Da mesma maneira que cuidamos de nossa família.
Não cuidamos dela como algo exterior, como se fosse exterior a nós e como se pudéssemos viver sem ela. Cuidamos a partir do interior, como interessados.
Esse cuidado se manifesta, claro, na oração que fazemos por toda a Igreja. Quando rezamos, não rezamos apenas por nós, mas por toda a Igreja. Mas é preciso mais que apenas oração, é preciso participação. Não freqüência simplesmente: participação, interesse, envolvimento. A comunidade é construção nossa, somos nós que a fazemos.
A Igreja é esta comunidade. Cuidamos de nosso corpo, cuidamos também do corpo eclesial. E é preciso que dele cuidemos que nos interessemos pelas coisas da
comunidade, da Igreja, por sua situação, suas necessidades, suas realizações. Igreja não é os outros. Igreja somos nós. Sou também eu, que participo da eucaristia.
E se é preciso cuidar do corpo eclesial, também não é fora de propósito pensar no cuidado que devemos ter com o corpo social. A eucaristia nos envolve na realidade da
sociedade quando se afirma como alimento para a nossa vida. E são tantos os privados de alimento! E não apenas do alimento eucarístico, mas também do alimento cotidiano.
Alimentamo-nos de Deus para que nos tornemos capazes de nos alimentarmos uns aos outros, através da partilha e da caridade. Não se pode perder isso de vista, sob o risco de
perder o significado mesmo da eucaristia. Não se pode falar do Corpo de Cristo e esquecer os corpos de tantos irmãos nossos que fazem perdurar em seus corpos o sacrifício de Jesus. Tantos são os sofredores de nosso mundo, tanto sofrem em seus
corpos, por falta de saúde, de alimento, de moradia, de cuidado, de atenção, de direitos... Não há como comungar o corpo sofredor de Cristo sem ser tocado pêlos corpos sofredores de nossos irmãos e irmãs. A realidade da eucaristia nos compromete com a prática da caridade. Cristo por nós se entrega, e se o recebemos é para que aprendamos a partilhar, a entregá-lo ao mundo, através também do testemunho de
caridade. Não queiramos apenas receber de Jesus, mas saibamos também dar de nós. Com efeito, o cuidado com os sofredores é uma marca do cristianismo. Mesmo os não, cristãos cuidam de quem sofre, mas os cristãos o fazem por razões de fé, como que por obrigação derivada da fé, e não apenas da morai. O corpo de Cristo nos aproxima dos corpos de nossos irmãos e irmãs que precisam de cuidado, de atenção, de fraternidade,
de solidariedade, de justiça, de direitos. A eucaristia não substitui a caridade, ao contrário, a causa e coloca-a como compromisso de vida.

Padre Antonio Manzatto

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