Liberdade II: Há liberdade sem verdade?

Liberdade e verdade
No texto «Liberdade-I», lembrávamos uma realidade evidente: se o nosso raciocínio, se o nosso modo de pensar na vida e nas coisas da vida, nas escolhas pessoais e nas decisões, é confuso ou errado, como poderemos escolher “bem”?
E muito importante perceber que a falta de lucidez do pensamento é uma doença mortal da liberdade. Pensar mal leva a escolher mal. Mas são poucos os que reconhecem que “não pensam bem”. Acham que se “eles” pensam, que se “isso” é o que “eles pensam”, então está bom! Será? Vamos fazer uma reflexão muito simples.
Podem servir-nos, como referencial, algumas experiências do cotidiano. Um conhecido, por exemplo, conta-nos que resolveu ir com o filho de São Paulo ao Rio de Janeiro: uma viagem-prêmio que o pai prometera (pai sentimental, que premia a mera obrigação) se o filho passasse de ano. Aí temos os dois, mais a mãe e uma irmã, no carro, com o bagageiro atulhado. O rapaz premiado assume o volante. Está ansioso por chegar ao Rio. – “Você conhece a saída de São Paulo para a Via Dutra?”, pergunta-lhe o pai. O moço sorri com ar de suficiência. Nem se digna responder. Claro que sabe! E, ei-lo rodando por um emaranhado de ruas, de mãos e contramãos, de viadutos e elevados. Vai com uma segurança magnífica. Pega atalhos de homem esperto. Até que, duas horas depois, todos percebem que estão indo exatamente em sentido contrário, rumo ao Mato Grosso, na direção Oeste…
Outra experiência, que dispensa comentários, é a dos fracassos e decepções no casamento, que nos cercam, infelizmente, em quantidade quase incontável. Em muitos desses casos lamentáveis, o que houve – além de sérias falhas morais – foi um engano. A pessoa – apesar das observações objetivas de amigos, de colegas, de familiares – empenhou-se em casar-se com fulano ou sicrana. Achava que os outros não a entendiam. Só ela sabia. Até que, passados poucos meses, ou um ano, ou dois, teve que dizer, com a cara coberta de vergonha: “Eu me enganei”, “Eu não sabia”… Agiu com total independência, com absolua “liberdade”, mas sem nenhum conhecimento profundo, sem a base da razão esclarecida, que é imprescindível para se viver a verdadeira liberdade.
A verdade, sangue arterial da liberdade
O Papa João Paulo II não se cansou de insistir em que «o conhecimento da verdade é condição para uma autêntica liberdade» (ver Encíclica Veritatis Splendor, n. 87). Com essas breves palavras, estava dizendo algo de essencial. É óbvio que, se um engano – uma falta de conhecimento da realidade, da verdade das coisas – em assuntos como o casamento ou a profissão, pode ser funesto e até mesmo frustrar a nossa vida, mais ainda nos pode arrasar o erro a respeito dos verdadeiros bens, do verdadeiro ideal, do verdadeiro sentido da nossa vida. Oxalá não sejamos daqueles que só se dão conta de que erraram redondamente quando já estão sem retorno, na velhice ou à beira da morte: “Eu achava”, “Eu não percebi”, “Agora é tarde”…
A liberdade autêntica precisa da verdade, que lhe dá sentido, rumo e firmeza; que é como a estrela que lhe marca o rumo; que a orienta e a potencia para construir e não para destruir. É – dizia alguém – como o sangue arterial para o corpo!
Isso é o que não conseguem entender os que confundem a liberdade com o desejo e a autenticidade com a simples espontaneidade irrefletida. Perdidos num “espontaneísmo” simplório, e num conceito também superficial da liberdade -entendida como livre vazão dos gostos e desejos -, não conseguem se aprofundar, nem conseguem entender aquelas pessoas que são livres de verdade: aqueles que agem movidos por um ideal bem conhecido, por um raciocínio objetivo e sábio, fruto de séria reflexão; os que, por isso mesmo, tomam decisões inteligentes e livres, não atreladas, como a carroça ao jumento, aos estados de ânimo e às oscilações dos desejos.
São Josemaría Escrivá, que amou e defendeu a liberdade com paixão, tem, sobre este tema, umas palavras que vale a pena meditar: «O Amor de Deus marca o caminho da verdade, da justiça e do bem. Quando nos decidimos a responder ao Senhor: a minha liberdade para Ti, ficamos livres de todas as cadeias que nos haviam atado a coisas sem importância, a preocupações ridículas, a ambições mesquinhas. E a liberdade – tesouro incalculável, pérola preciosa que seria triste lançar aos animais – emprega-se inteira em aprender a fazer o bem. Esta é a liberdade gloriosa dos filhos de Deus» ( Amigos de Deus, n. 38).

[Adaptação de um trecho do livro de F. Faus, Autenticidade & Cia]

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